quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

IRMÃOS CORAGEM - CAPÍTULO 5

Roteirizado por Antonio Figueira
do original de Janete Clair


CAPÍTULO 5

CENA 1 - COROADO - PRAÇA - EXT. DIA.
Em Coroado, a festa atingira o auge. Duda, abraçado a mãe e ao irmão Jerônimo, ouvia o discurso de saudação do prefeito Jorginho. A emoção lhe provocava lágrimas. A cada frase o povo aplaudia.
Ritinha permanecia inerte, olhar no rosto de Duda, como a esperar um sorriso do amigo de infância. Em certo instante os olhares se cruzaram. O coração da jovem palpitou mais forte. Fora um momento só. Duda não a reconhecera. A voz do prefeito se destacava no vozerio geral.

PREFEITO - Se me permitem o trocadilho, Duda saiu de Coroado de cabeça limpa e voltou com a coroa do rei. Via o nosso Duda! Viva o nosso rei!

A banda reiniciou o dobrado, enquanto a multidão carregava sobre os ombros o novo ídolo da cidade. Lágrimas espocavam dos olhos de Ritinha. A decepção ferira-lhe o amor-próprio. E com as lágrimas a banhar-lhe a face, deitou o rosto sobre os ombros de Domingas, sua confidente e mãe de criação.

DOMINGAS - Toma jeito, Rita. Não fica assim. Chorando que nem bebê por uma coisa á toa...

Jerônimo, que assistia á cena, aproximou-se da moça.

A banda se afastava, enquanto os brados de Viva Duda! Se confundiam com os gritos da multidão.

RITINHA - (levantando os olhos, ao notar a presença do irmão de Duda) Ele nem me reconheceu, Jerônimo.

JERÕNIMO - Pudera, Ritinha. Quando saiu daqui, ocê era menina, feia, sardenta, de trancinha. Agora ta uma moça... bonita que nem sei.

DOMINGAS - Já disse prela. Num falta home bão que te queira. Fica aí pensando no Duda, dia e noite, feito uma boba.

RITINHA - Me leva embora, Domingas. Não quero nunca mais ver a cara dele. Nem a raça de vocês.

Ritinha se afastou a passos rápidos, quase correndo, na tentativa de conter as lágrimas que não cessavam de cair. Jerônimo, tristonho, observava a retirada da jovem. Ao longe o carro de Duda se perdia no meio da turba.

CORTA PARA:

CENA 2 - RANCHO DOS CORAGEM - INT. - DIA.

No chão do rancho o velho Sebastião permanecia desacordado. Um filete de sangue traça um risco escuro no alto da fronte do garimpeiro idoso. Potira estacou repentinamente ao ver o corpo do pai de criação. Mestiça de cabelos longos e olhos sombrios, desde criança fora criada pela família Coragem. Amava o velho garimpeiro com amor de filha verdadeira. E havia quem dissesse que a indiazinha dos Coragem era produto de antiga paixão do velho de Sinhana, durante suas andanças pelo sertão de Goiás. Potira sacudiu o pai de criação e o arrastou para uma esteira, no quarto de Jerônimo. Retirou a rolha de uma garrafa de aguardente e despejou um gole na boca do ancião. Sebastião voltou a si, meio zonzo.

POTIRA - Me fala, padrim... que lhe aconteceu?

O velho, gemendo, colocou a mão na cabeça.

POTIRA - Um galo feio. Alguém lhe bateu?

SEBASTIÃO - Os maldito... dos jagunço de Barros... tiveram aqui, Potira.

POTIRA - Os home de Pedro Barros?

SEBASTIÃO - Viero me assustá. Se aproveitaro... os marvado... de eu ser velho e doente. Com meus filhos eles não se mete...

POTIRA - (revoltada) Diz pros menino, conta tudo. Os menino dá uma lição neles.

SEBASTIÃO - Não... não. Depois da festança eu conto.

CORTA PARA:

CENA 3 - CABANA DE BRAZ CANOEIRO - QUARTO - INT. - DIA.

Braz Canoeiro gemia, amparado pelos braços de Cema. O castigo de Juca Cipó fora terrível.

CORTA PARA:

CENA 4 - CABANA DE BRAZ CANOEIRO - SALA - INT. - DIA.

João Coragem observava as reações da jovem que vira no carro do coronel Pedro Barros. Era bela. De traços finos e sorriso triste.

JOÃO - Tá melhor, moça?

MARIA DE LARA - Sim, um pouco, obrigada... mas por que esse homem está gemendo tanto?

JOÃO - É Braz Canoeiro. Deram uma purga nele e ainda por cima quase mataram ele de pancada...

MARIA DE LARA - Quem bateu nele?

CEMA - (aparecendo na sala) Os bandido de Pedro Barros.

A moça estremeceu.

CEMA - Meu Braz era meia-praça dele. Antes donte os home cismaro que meu Braz engoliu um diamante. Quase mataro ele pra devolvê o que ele num tinha. Esse ainda escapou com vida. Mês passado mataro um alugado porquê num queria mais trabalhá preles.

JOÃO - (sério) Todos nós somos, mais ou menos, escravo de Pedro Barros... ele é o dono de quase todas as serra do garimpo. Todos sofremo a opressão do domínio dele. Eu nem tanto, que tenho meu próprio garimpo e coragem pra enfrentá esse home.

No quarto Braz gemeu mais alto, um gemido rouco, quase estrangulado. João e Cema correram para o local. Só, na sala, a jovem não se sentia bem. Pela janela viu o cavalo do homem que lhe prestara ajuda. O tropel despertou a atenção de João Coragem. Correu para a porta.

CORTA PARA:

CENA 5 - ESTRADA DE CHÃO - EXT. - DIA.

Era tarde. Partindo a galope, a moça já se perdia na escuridão da estrada.


JOÃO - Danada! Fugiu no meu cavalo!

CORTA PARA:

CENA 6 - RANCHO DOS CORAGEM - INT. - NOITE.
Na casa do rancho Coragem a família reunida jantava em companhia de Duda. João não havia chegado do encontro que tivera com os negociantes estrangeiros. A graciosidade de Potira chamara a atenção do moço. Os olhos de Duda acompanhavam os movimentos da jovem.

DUDA - Essa índia ficou uma beleza!

Jerônimo, sem que ninguém notasse, voltou os olhos para Potira. O amor que nascera entre os dois, apesar das negativas do rapaz, era coisa que só motivo de sangue poderia impedir. A própria Sinhana sentira isso e tentava cortar as ilusões de ambos antes que as coisas piorassem... Ela, também, secretamente, acreditava que a bela índia fosse filha do marido. O amor de ambos nascera como o próprio mato da região e crescia a cada instante.

O velho Bastião ouvia Duda contar a história de sua vida na cidade grande.

DUDA - Lá também a gente tem de se defender como pode. Duas vezes fui parar no Juizado de Menores. Duas vezes fui preso. Passei fome, pai. Quando saí daqui não tinha profissão, nem nada. Mal sabia ler, se lembra?

SEBASTIÃO - E dispois, como é que ocê chegou a ser jogador, mesmo?

DUDA - Ah, isso foi depois de uns dois ou três meses. Morrendo de fome, dormindo em praças, fugindo dos guardas, um dia fui jogar uma pelada num campo de subúrbio. Um cara lá me viu e perguntou se eu queria ir treinar no Flamengo. Eu fui e me botaram no juvenil. Daí a coisa foi fácil.

SINHANA - E esse tal de Flamengo... é time bão?

DUDA - O maior time do mundo, mãe!

Duda passou a mostrar fotos de sua presença nos estádios.

DUDA - Esta ao lado de Pelé... aqui com Garrincha... este é o Rubens.

Uma voz encheu de calor o recinto da sala.

JOÃO - E este aqui é Duda e João...

Todos os olhos se voltaram para João Coragem, que acabara de chegar, braços abertos, sorriso largo. Os dois irmãos se abraçaram, demoradamente.

JOÃO - Veja só, tá um home o safado! E famoso. Aquele gato pingado... tá famoso! Jogador de futebol, veja só.

SEBASTIÃO - (aproximando-se dos filhos) Vamo todos tomá um gole. Hoje é dia de alegria na casa de Sebastião Coragem. Vamo beber em honra a esse tal de doutô Flamengo!

FIM DO CAPÍTULO 5

NÃO PERCA, NA PRÓXIMA SEXTA, O 6. CAPÍTULO DE IRMÃOS CORAGEM

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